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quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Haiti – suas crises também são minhas

Como africana em Diáspora, tanto quanto os afro-haitianos, cada cara de dor estampada nos tablóides me causa um incômodo desconsertante como quem acaba de ver um parente passando fome e está sentado à mesa posta e farta.
Mas não é a dor de ver o sofrimento e desespero deles, é o desconforto de quem não está fazendo nada diante daqueles açoites que marcam a carne ainda hoje.
O que aconteceu no Haiti pode ter sido catástrofe natural, mas o tratamento pós-desastre é que nunca vai ser comparado ao que se daria a qualquer terra loira européia que tivesse passado por algo parecido. Afora as explicações cientifissíssimas que foram dadas pelo pastro norte-americano que associou a desgraça haitiana a pactos com o demônio em prol de sair das algemas da colonização francesa. E o Cônsul? Macumba amaldiçoou aqueles povos e as religões de matrizes africans mais uma vez são responsabilizadas pelos males do mundo à revelia de seus praticantes. E Arnaldo Jabor? Povos primitivos e bárbaros. Primitivos, sim, posto que primitivo é o que vem primeiro e somos mesmo os primeiros habitantes desse mundo e toda linhagem da raça humana de nós surgiu (vou acreditar que ele usou o termo nesse sentido). No entanto, bárbaros não somos, nem nunca fomos, afinal, esse não foi o povo deorigem germânica que invadiu o Império Romano séculos atrás? O não enfadonho e intelectual Jabor devia saber disso, sobretudo por que esse povo tá mais lá pras bandas do sangue dele, do que do nosso.
Todo dia um vídeo, uma foto, uma notícias e uma dor nova. E os braços atados, como doem. Doem como de os ossos de meu coração invertebrado, de repente, estivessem torcidos.
Doações, cartas públicas de solidariedade, notas de repúdio ao Cônsul, adoção de crianças órfãs, embarque para ajudar os feridos e desabrigados: tudo em plena validade. Só não sei do despertar do amanhã na História desse país. Aquele a quem, depois da exploração, só restou o desprezo da comunidade internacional, agora tem sobre si os olhos do mundo para ver a sua derrocada fatal.
E eu?
No âmago da minha inutilidade, choro!
Ou:
penso no Haiti, rezo pelo Haiti!
Isso por que suas crises são tão minhas que, como ele, também não sei pra que lado vou.

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